sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

VOZES DA SECA Luiz Gonzaga

 Nas minhas pesquisas para trabalhos escolares com as crianças, me deparei com a letra da música "Vozes da Seca". Quanta sabedoria nessa composição! O cantor e compositor Luiz Gonzaga usou a linguagem do povo humilde do sertão brasileiro. Muitas pessoas nos dias de hoje não conseguem compreender bem a letra dessa música devido a alguns termos que ele empregou que hoje em dia já bem pouco é usado. Fiz a tentativa de colocar dentro de uma escrita mais clara, porém, acho importante que se veja a letra original. Uma verdadeira riqueza! Por isto posto-a logo após a versão com correções. É mais bonita... Tudo é muito mais bonito quando na linguagem do povo humilde, pois falam  com o coração.





Vozes da Seca
(Com correções gramaticais)

Seu doutor[1] os nordestinos têm muita gratidão
Pelo auxílio dos sulistas nessa seca do sertão
Mas doutor uma esmola para um homem que é são
Ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão.

É por isso que pedimos proteção a Vossa Mercê,
Homem por nós escolhido[2] para as rédeas do poder[3];
Pois doutor dos vinte estados do Brasil têm oito sem chover[4].
Veja bem: quase a metade do Brasil tá sem comer.

Dê serviço a nosso povo, encha os rios de barragens[5],
Dê comida[6] a preço bom, não esqueçamos a açudagem[7].
Livre assim nós da esmola[8], que no fim dessa estiagem[9],
Lhe pagamos até os jurus sem gastar nossa coragem[10].

Se o doutor fizer assim salva o povo do sertão.
Quando um dia a chuva vier, que riqueza pra nação!
Nunca mais nos pensaremos em seca, vai dá de tudo nesse chão.
Como vê nosso destino Vossa Mercê[11] tem nas vossas mãos.






[1] Segundo a Jornalista, escritora e documentarista Eliana Brum, doutor é um título que “no passado, era usado pelos mais pobres para tratar os mais ricos e também para marcar a superioridade de médicos e advogados”. Muitos humildes ainda hoje, chamam de doutor (doutô) além dessas pessoas citadas por Brum, aos políticos eleitos pelo povo. Na letra original de Gonzaga ele usa o termo “Seu douto” para se referir ao político escolhido para representar o povo.
[2] Na letra original Luiz Gonzaga usa “Home pur nóis escuído” que é a linguagem dos humildes que pouca chance tiveram de instrução. A tradução é: Homem por nós escolhido.
[3] Rédeas do Poder Na letra original Luiz Gonzaga usou a linguagem escrita popular do povo humilde do Nordeste, ou seja “rédias do pudê”. Quer dizer escolhido para fiscalizar os atos do poder público, e também para sugerir, aprovar, reprovar e/ou propor leis, como representante do povo, para o bem de todos os habitantes do País.
[4] Na ocasião em que essa música foi composta o Brasil ainda não tinha 28 Estados.
[5] Barragens – Na letra original o compositor usou “barrage” pelos mesmos motivos relacionados na referência 2.
[6] Comida – O compositor usou  o termo “cumida” pelos mesmos motivos relacionados na referência 2 e 4.

[7] Açudagem – Na letra original o compositor usou “açudage” pelos mesmos motivos relacionados na referência 2, 4 e 5.
[8] Esmola - Na letra original o compositor usou “ismola” pelos mesmos motivos relacionados na referência 2, 4, 5 e 6.

[9] Estiagem - Na letra original o compositor usou “estiage” pelos mesmos motivos relacionados na referência 2, 4, 5, 6 e 7.

[10] Coragem - - Na letra original o compositor usou “corage” pelos mesmos motivos relacionados na referência 2, 4, 5, 6, 7 e 8.
[11] “Vossa Mercê” – A língua, por ser uma estrutura viva, está em constante processo de transformação. Uma delas refere-se ao pronome de tratamento vossa mercê, que com o passar do tempo foi, gradativamente, se transformando em você. Na letra original de Luiz Gonzaga ele colocou “VOSMICÊ”.

Letra original
Vozes da Seca

Seu doutô os nordestino têm muita gratidão
Pelo auxílio dos sulista nessa seca do sertão
Mas doutô uma esmola a um homem qui é são
Ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão

É por isso que pidimo proteção a vosmicê
Home pur nóis escuído para as rédias do pudê
Pois doutô dos vinte estado temos oito sem chovê
Veja bem, quase a metade do Brasil tá sem cumê

Dê serviço a nosso povo, encha os rio de barrage
Dê cumida a preço bom, não esqueça a açudage
Livre assim nóis da ismola, que no fim dessa estiage
Lhe pagamo inté os juru sem gastar nossa corage

Se o doutô fizer assim salva o povo do sertão
Quando um dia a chuva vim, que riqueza pra nação!
Nunca mais nóis pensa em seca, vai dá tudo nesse chão
Como vê nosso distino mercê tem nas vossa mãos